Variable Fonts (Projeto Final)

Neste artigo apresento os resultados de meu projeto final. Além de continuar a investigar a respeito das Variable Fonts, dei início à adaptação de Lipsia para este formato.

Experimentos iniciais

Atualmente, Lipsia é uma família tipográfica composta por 30 cortes distintos para o Romano e 30 para o itálico, variações de peso: Thin, Light, Regular, SemiBold, Bold e Black e variações de largura: Ultra Condensed, Condensed, Normal, Expanded e Ultra Expanded. Ou seja, ao final são 60 arquivos distintos de fontes. Para o desenvolvimento desta família utilizei a metodologia consolidade de mestras múltiplas. São 7 mestras: Black Extended, Black Compressed, Regular Extended, Regular, Regular Compressed, Air Extended e Air Compressed. As mestras Air são hairlines, isto é, desenhei apenas a espessura mínima dos caracteres (4upm), de modo a interpolar com precisão entre o Regular e Light e Thin desejados.

Para exportar Variable Fonts é preciso modificar alguns parâmetros em relação à uma fonte OpenType estática. Neste caso, segui o excelente tutorial fornecido pelos desenvolvedores da aplicação Glyphs. Ao tentar preparar a fonte para exportação, verifiquei que muitos caracteres como marcas diacríticas continham erros. Para executar um piloto, reduzi o conjunto de caracteres para apenas caixa-alta, a, d, h, e, s, i, o, n (palavra síntese utilizada para analisar as principais formas do alfabeto em caixa-baixa) e os algarismos tabelares em estilo antigo, para verificar como se comportam os alinhamentos verticais.

Após a exportação, carreguei o ficheiro de fonte na plataforma online de testes Font Gauntlet da ABC Dinamo. Apesar de satisfatório, pois a fonte funcionava de modo dinâmico, logo percebi erros que me haviam escapado anteriormente.

1° teste com o caracter n.
traço desencontrado no algarismo 5.

Neste caso específico do algarismo 5, voltei ao editor de fontes Glyphs e notei que, apesar de nos cortes mais leves o encontro estar correto, nos cortes mais pesados havia uma junção que não causa problemas em fontes estáticas, mas que em Variable Fonts torna-se um erro grotesco.

sobreposição problemática em Variable Fonts e inofensiva em fontes estáticas.

Outro problema que encontrei foi a ordem dos traços no caracter N. Em fontes estáticas este tipo de mudança de ordem dos traços às vezes causa problemas de interpolação e exportação, curiosamente neste caso não, porém, ao transpor para o formato Variable Fonts, o erro tornou-se evidente.

inverção nos traços causada por ordem inconsistente.

Ainda a trabalhar no mesmo ficheiro, realizei correções nestes dois caracteres e voltei a exportar a fonte, apenas para ter certeza de que funcionava propriamente.

algarismo 5 corretamente construido.
N devidamente ajustado.

Apesar de a estratégia de desenhar mestras hairline ser excelente, muito provavelmente em algum ponto do projeto elas deverão ser trocadas por um Light ou Thin, isto porque, em Variable Fonts todos os pesos são acessíveis ao utilizador final. Não convém fornecer instâncias que não sejam utilizáveis de fato em projetos de design. Portanto, voltei a editar a fonte de modo a substituir as mestras e gerar uma nova Variable Font em que todo o espectro de design fosse correto. No caso de Lipsia isto é mais evidente em relação aos contrastes e áreas de junção entre curvas e retas.

Após a interpolação entre Regular e Air, reutilizei os pesos Thin como novas mestras.
Porém, ao invés de passar a ter 9 mestras, era necessário excluir duas das anteriores, isto é, as hairlines, selecionadas em azul na imagem.
Após a exclusão, foi necessário corrigir os nomes das mestras.

Além de corrigir os nomes das mestras, foi necessário ajustar os parâmetros “weight” que estavam pensados para fontes estáticas e optimizadas para aplicações de desktop, tais como as aplicações da Adobe. Há um bom tutorial de como fazê-lo, pois o nome das mestras e instâncias é um tema complexo. Em resumo, Variable Fonts necessitam de nomenclatura condizente com CSS para poderem ser implementadas corretamente nos websites.

Nova exportação. Contrastes corretos nos pesos mais leves.
Por serem bastante geométricos e regulares, os caracteres da caixa-alta representam um desafio bem menor.
Não é possível manter a mesma largura de composição entre Extended e Compressed, mas é possível criar variações proporcionais e consistentes.

O exercício de exportar uma fonte em Variable Fonts é muito valioso. Em nível de desenho, de facto, não há mudanças tão radicais em relação ao fluxo de trabalho concretizado para fontes em múltiplas mestras, porém, detalhes importantes precisarão de adaptações e isto representa potencialmente bastantes horas de trabalho.

Em nível de planejamento e engenharia de fonte, de facto as mudanças poderão ser maiores, no entanto, é um formato que representa muitas vantagens e será incontornável implementá-lo para novos projetos de type design. Para além da redução no tamanho dos ficheiros, é muito mais conveniente manipular apenas um ficheiro de fonte, com todas as variações necessárias, do que ter de instalar 60 ficheiros distintos.

Lipsia é um projeto de fonte comercial. Meu planejamento é lançá-la para venda no outono/inverno, porém, através deste exercício notei que é uma oportunidade para simultaneamente realizar as correções necessárias e já adaptá-la para o formato Variable Fonts. Não só é comercialmente inteligente lançar novas fontes em ambos os formatos, como também ao testar em Variable Fonts erros anteriormente escondidos tornam-se aparentes. Isto melhora a qualidade técnica da fonte como um todo e a coerência do sistema de design.

Para explorar mais

Alguns bons recursos para introduzir-se no tema são o já mencionado artigo de John Hudson. Há um artigo ricamente ilustrado na revista Slanted e papers interessantes como de Diego Maldonado e também de Maíra Woloszyn, Mary Meürer & Berenice Santos Gonçalves. Além de novas fontes variáveis surgirem com frequência, seu uso e estudo tem aumentado visivelmente.

Deixe um comentário